MARIA, MODELO VOCACIONAL

Jair Nascimento
Formador da Crux Sacra

Lc 1, 26-38 

Deus nunca levanta uma vocação em vão, nunca escolhe alguém por nada, sem nenhum motivo. É interessante que quando Deus começa a dar consciência do que ele espera de nós, ele sempre tenta, de alguma forma, mostrar o que quer de nós. Este chamado algumas vezes acaba causando certa “confusão”, como foi no caso de Maria. 

É importante perceber que Maria se perturbou não com o anjo, mas com a saudação; tanto é que, quando a gente lê, o diálogo dela parece ser tão natural. Porém, o interessante foi ela ter refletido sobre o novo nome através do qual o anjo a tinha chamado, pois antes de chamá-la de Maria, chamou-a de cheia de graça. Eu entendo que quando Deus nos chama Ele diz alguma coisa sobre nós, nos lança um nome, nos dá uma direção que consequentemente vai mexer com a nossa vida. Acredito que a inquietação de Maria era “por que Ele me chamou por este nome e resolveu me saudar desta forma?”, o que é que Ele quer dizer com isso? O que é que Ele quer de mim quando me chama de cheia de graça? E para nós também fica um questionamento: O que Deus quer dizer para nós quando nos chama? 

Quando Deus nos chama Ele diz alguma coisa sobre nós que muda nossa vida. No texto bíblico em que estou fundamentado, Deus diz muitas coisas sobre Maria. Se continuarmos lendo, vamos entender o que Ele diz a respeito do carisma de Nossa Senhora. Na Bíblia, o nome revela a missão de cada um, tanto é que quando Deus chamava alguém Ele mudava o seu nome oficial para um novo que dizia muito mais sobre aquela pessoa ou sobre o que Deus realizava na sua vida. 

Diante das promessas de Deus sobre aquele que Maria carregaria em seu ventre, ela fez uma pergunta muito importante: como é que vai fazer isso? Para mim é muito mais que um questionamento; eu vejo, neste diálogo de Maria, a preocupação de querer entender o que ela poderia fazer para cooperar com o que Deus estava querendo com a sua vida, que era dar a luz ao filho de Deus. Prontamente Maria perguntou: como é que isso vai acontecer se eu ainda não me relacionei com José? Como é que eu vou cooperar com este projeto se eu não me casei ainda com José? É válido observar que esta disposição de Maria em querer entender é provavelmente aquilo que falta em nós, porque muitas vezes questionamos no sentido de querer duvidar. Se olharmos o anúncio de João Batista, o questionamento de Maria é totalmente diferente do de Zacarias. O mesmo anjo fala para Zacarias que Isabel, já uma mulher de idade, iria ficar grávida. E esse homem diz: como é que eu posso ter certeza disso? Veja a diferença: enquanto da parte de Zacarias havia uma dúvida, Maria procura entender como ela precisa fazer diante da sua limitação como pessoa humana, o que ela precisa fazer para cooperar com o projeto Deus. 

Maria estava noiva de José. Quando questionou “como é que se daria isso”, talvez ela esperasse que o anjo dissesse: “você vai se casar logo com José para o menino nascer”; mas ele falou: o Espírito Santo descerá sobre ti e a força do altíssimo te envolverá com a sua sombra. Deus, com seu projeto, nunca vai se enquadrar na lógica humana, no nosso raciocínio humano. Havia aqui uma possibilidade clara, humana e fácil para que Maria pudesse seguir sem correr riscos – porque a possibilidade sobrenatural fez com que Maria corresse risco e até risco de morte, pois a lei daquele tempo dizia que se uma mulher aparecesse grávida sem ter um homem, ela era arriscada a ser apedrejada na porta de casa. Sendo assim, aquilo que Deus propõe para nós nunca vai estar dentro do nosso padrão humano e, com certeza, uma vocação, um chamado vai fazer com que nós corramos risco. 

Mas é interessante perceber como Deus preparou todos os caminhos para convencer José; porque ai de Maria se José não tivesse aceitado, ela poderia ter morrido. Deus foi providenciando todos os meios para que aquilo que Ele queria de Maria fosse realizado. Essa mulher santa, que foi impulsionada a dar um passo na fé. Assim sendo, cabe o questionamento: será que eu tenho arriscado minha vida por causa da minha vocação? Eu tenho corrido perigo por causa do chamado que eu abracei? Nós precisamos amar tanto o chamado que Deus nos faz a ponto de arriscar nossa vida por Ele, se nós entendermos que vale a pena. Maria fez porque ela entendeu que traria para o mundo o rosto de Cristo. E não é diferente conosco. Todos nós somos chamados a revelar a face de Cristo para o mundo. 

Logo, se eu não tiver fé, se eu não acreditar, nunca vou ter a possibilidade de fazer nenhum sacrifício pela minha vocação, porque as mediações de Deus vão exigir de mim esta obediência, esta disposição e, como consequência, uma atitude de entrega. Se eu entendo que a minha experiência com Deus foi uma experiência impactante eu vou fazer de tudo para que aquilo se cumpra dentro de mim. E essa foi a preocupação de Maria quando disse: “como é que isso vai acontecer se eu não tenho homem ainda?” A única direção que o Espírito deu para Maria foi esta: “é o Espírito Santo que vai conceder e como consequência orientar você na educação do menino.” A única possibilidade dada pelo anjo foi que ela precisava ser aberta ao Espírito Santo, precisava ser uma mulher de oração, ser uma mulher dócil à ação de Deus. Em João 16 está escrito que “o Espírito Santo nos ensinará todas as coisas”. Portanto, só o Espírito de Deus pode nos ajudar a viver o nosso chamado. 

Quais são as atitudes, as práticas que preciso ter para que eu veja as promessas do Senhor se cumprirem na minha vida? É um desafio, algo misterioso e, realmente, os projetos de direção de Deus são misteriosos, porque Ele é Deus, Ele vai sempre nos desconsertar. Vai depender de nós acreditarmos na promessa, naquilo que a gente não vê; acreditar que, se foi Ele que me chamou, o meu diálogo com Ele vai gerar paz. É interessante esta naturalidade do diálogo com Maria porque ela sentiu ali a presença de Deus, ela sabia que era Deus que estava falando com ela pela boca daquele anjo, então, consequentemente, houve uma resposta, mas nós vemos primeiro a atitude de Deus em buscar o homem, a atitude em buscar Maria, de querer se utilizar de Maria para algo sobrenatural em vista da salvação do seu povo. 

Os projetos de Deus vão nos confundir porque o seu caminho nos arrasta para dentro de nós. Ele sabe que nós temos consciência das nossas potências, mas sabe também que nós temos consciência das nossas fraquezas. Existe aquela fase em que tudo é fácil, eu não sou tentado, todo mundo é perfeito. Porém existe aquela fase em que tudo é difícil, em que já percebo as tentações, em que já não consigo sorrir como antigamente, onde tudo é impossível, e eu digo que eu não sou capaz, ou eu entendo que não vou ser santo pelas minhas próprias forças, ou não vou conseguir progredir. Aquele anjo queria dizer para Maria que para Deus nada é impossível. Sendo assim, o teu remédio, o teu caminho, a tua decisão, o teu conforto, quando você achar que não consegue, é clamar a Deus. 

Hoje Deus olha para nós com esta mesma pretensão; a pretensão de desafiar a nossa estrutura como pessoa. Assim como fez com Maria, o Senhor também resolveu nos dar um nome que vai fazer com que nós tenhamos uma visão nova sobre Ele, que vai nos dar força para que sejamos melhores, que vai nos dar um caminho de conversão e nos orientar de uma forma diferente; fazendo com que descubramos nossas capacidades e como consequência vai nos fazer santos e cooperadores com a salvação das pessoas. O que vai bastar para nós é o sim, precisamos manter o nosso sim como Maria que disse: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a vossa palavra”.